sexta-feira, 28 de maio de 2021

JÁ POSSO DORMIR DENTRO DE CASA...

Com a minha doença os meus donos passaram-me para dentro de casa, mais propriamente para uma almofadinha na cozinha, com algumas restrições quanto a deambular por ali dentro. A porta da cozinha para o resto da casa permanece fechada o tempo todo, mas a do jardim fica aberta e eu tenho sempre muita liberdade para andar por onde quero, menos pelos quartos e salas.

Na verdade eles têm tapetes por todo o lado e eu ainda não dou garantias de poder circular sem percalços ou acidentes involuntários. Também ainda gosto muito de roer com os dentes que tenho desde a nascença, por isso eles não me permitem grandes liberdades. Mas já é um progresso em relação a viver fora de casa numa casota! Eles aliás ainda hoje se arrependem de não me ter deixado entrar desde pequenino, a intenção era boa e informaram-se muito sobre se isso não seria cruel para mim, mas como me vigiavam de perto e eu parecia feliz, foram mantendo esse status quo até que fiquei muito, mas muito doente... 

Se fosse hoje nunca me teriam deixado de fora até aos 4 meses, e recomendam a todos os que nos leem que o não façam, porque apesar dos muitos cuidados com o meu conforto lá fora, nada é igual a deixarem-me dormir sob um teto quentinho e humano dentro de casa...

Mas como durante a doença não podia ficar fora de casa, na minha casota, a coisa foi-se resolvendo por si só. Assim que melhorei, continuei a viver dentro de casa durante a noite e durante o dia passava bons bocados no jardim, onde brincava sozinho ou com eles.

Entretanto aprendi a não roer nada, só uma vez atirei com uma embalagem de esparguete ao chão e diverti-me a roer um bocado daquilo, nada mais. Fiquei de castigo do lado de fora da porta da cozinha durante um bom bocado a olhar para dentro, muito arrependido. 

Logo que os meus dentes de leite começaram a cair deixei de ter tanta vontade de morder em quase tudo que girasse à minha volta ou ficasse perto da minha boca. É uma questão de aprendizagem, dizem os meus donos. Para me compensar deram-me brinquedos próprios para roer e ainda hoje que sou um jovem adulto cheio de juízo, aprecio umas boas roidelas nesses brinquedos, de vez em quando até "despacho" um deles para o caixote do lixo...

Contudo, há coisas que ainda não me são permitidas neste viver dentro de casa, mas deixo esse relatório para uma próxima publicação. 

Por agora só quero salientar que já não estou doente, durmo dentro de casa, ainda ando a tomar cortisona para não sofrer recaídas que nesta doença (meningite) são frequentes até aos dois anos de idade, por isso fico com muita sede e bebo muita água, e como consequência faço muito xixi. Mas só no jardim e na rua, quando me levam a passear. Em casa NUNCA!!!


segunda-feira, 17 de maio de 2021

SRMA (Meningite não infeciosa) e como estive tão doente!

Pouco depois do meu último post, tinha eu uns cinco meses de vida, num belo domingo em que estive a ajudar os meus donos a "arranjar o jardim" levando troncos de um lado para o outro, à noite comecei a vomitar e a ter dores de barriga. Fiquei sem fome e só me apetecia ficar quietinho, sem me mexer e sem que me mexessem. 

Os meus donos pensavam que eu estava com uma gastroenterite ou qualquer coisa desse género porque também tinha diarreia. Deram-me galinha cozida com arroz branco, tal como os humanos fazem com as suas crianças quando ficam doentes da barriga.

Passou-se um, dois, três dias e eu estava cada vez pior. Nessa altura decidiram levar-me ao médico na Associação Zoológica de Portugal (AZP) onde fui várias vezes, sem que se encontrasse uma razão para o meu mal estar. E eu cada vez pior, até que fui internado já em desespero de causa dos meus donos que não sabiam o que fazer comigo. A minha dona acordava de noite para ver como eu estava e de cada vez me encontrava pior...

É preciso dizer que entretanto nesta fase de desespero entrei finalmente em casa como eu tanto queria, mas tão mal eu me sentia que não passava do cantinho onde me colocaram e o resto da casa não me interessava para nada. 

O que é que eu sentia? Uma enorme dor de cabeça, como se tivesse o mundo inteiro em cima de mim. Não conseguia comer nem beber, porque o meu corpo estava hirto, todo encolhido e nem conseguia baixar a cabeça para o meu prato, quanto mais engolir. Tinha febre alta e quando me apalpavam a coluna a meio das costas, sentia dor e gemia.

Decidiram todos que devia ficar internado no Hospital Veterinário da AZP para poder ser alimentado por via intravenosa e para poder ser melhor observado. Entretanto os vários diagnósticos dos médicos passavam por pancreatite, algum alimento envenenado, tudo menos o que na verdade se veio a descobrir mais tarde. E entretanto o meu sofrimento era grande!

Num desses dias de internamento na AZP um dos veterinários reparou que eu abanava involuntariamente uma das minhas patas da frente sem qualquer razão aparente e desde logo percebeu que a doença que me acometia deveria ter consequências neuromusculares e não gastrointestinais, e portanto a causa seria de natureza neurológica.

Nesse dia os meus donos receberam um telefonema que os assustou imenso: o que eu tinha era uma meningite não infeciosa (senão já teria morrido!) que deveria ser responsiva a medicamentos esteroides, em inglês conhecida como Steroid Responsive Meningitis-Arteritis (SRMA). 

Na verdade a partir daí tudo mudou: comecei a tomar medicamentos com base em cortisona e 12 horas depois já era outro cãozinho. Os meus donos visitavam-me todos os dias, e a partir dessa descoberta todos os dias viam que eu estava a melhorar. Mas podia ter morrido, foi uma sorte!

O Othelo ainda com a cabeça raspada no local onde fez a punção lombar

E porquê? Porque a origem da doença é autoimune, os sintomas são muito semelhantes a outras causas e nem todos os veterinários detetam logo que o que se passa tem origem em fatores genéticos. E pode ser fatal!

Estive dois anos em tratamento com corticosteróides, que como se sabe têm efeitos secundários muito desagradáveis para todo o ser vivo. Mas curou-me da doença.

Nesses dois anos fui "desmamado" dos corticosteróides, porque não se pode parar de um momento para o outro com esses tratamentos, as doses têm que ser gradualmente reduzidas. Mas tive de voltar ao princípio por duas vezes, porque tive recidivas. 

Duma dessas vezes fiz uma punção à medula espinal para confirmar se havia infeção, o que felizmente não se confirmou, mas esta doença não é brincadeira nenhuma...

Como os meus donos já conheciam os sintomas, levavam-me imediatamente ao médico que me dava um fortíssimo analgésico intramuscular e medicamentos para a fase seguinte, ou seja, mais cortisona. Entretanto foram-nos dizendo que talvez por volta dos meus dois anos de idade eu passasse a ter um sistema mais desenvolvido do ponto de vista imunológico, e a conseguir resistir ao ataque que as minhas próprias células faziam à minha meninge.

O que é que os meus donos fizeram? Estudaram o assunto a fundo: como não encontraram quase nada escrito em língua portuguesa, googlaram em inglês e aí sim, ficaram a saber o sério que era ter um cão com SRMA. E tomaram uma decisão, fazer tudo o que tinham estudado para me curar do meu mal.

E assim foi. Desde logo decidiram alterar a minha alimentação: em vez de ração passaram a dar-me comida crua, mas não é qualquer comida. É comida crua biologicamente adequada a animais de quatro patas, que é o meu caso. O acrónimo em inglês é BARF (Biological Adequate Raw Food). Um destes dias digo-vos em que consiste e como é deliciosa...

E foi assim que me curei da SRMA! Nunca mais tive nada e vou fazer cinco aninhos muito em breve. Se mais alguém tiver problemas desta natureza com o seu animal de estimação, não se esqueçam de falar ao médico nesta doença. É terrível, faz doer imenso, e pode levar à morte se não for tratada a tempo.

Os sintomas são: corpo tenso, pescoço hirto e doloroso, sem se conseguir mexer, febre alta, apatia e diarreia. Vão logo ao Hospital e perguntem se o vosso cão poderá estar a sofrer de uma meningite. Pode ser que não seja, mas se for um diagnóstico cedo evita muito sofrimento.